quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

Eterno


A cada instante se criam novas categorias do eterno
Eterna é a flor que se fana
se soube florir
é o menino recém-nascido
antes que lhe dêem nome
e lhe comuniquem o sentimento do efêmero
é o gesto de enlaçar e beijar
na visita do amor às almas
eterno é tudo aquilo que vive uma fração de segundo
mas com tamanha intensidade que se petrifica e nenhuma
força o resgata
é minha mãe em mim que a estou pensando
de tanto que a perdi de não pensá-la
é o que se pensa em nós se estamos loucos
é tudo que passou, porque passou
é tudo que não passa, pois não houve
eternas as palavras, eternos os pensamentos; e
passageiras as obras.
Eterno, mas até quando? é esse marulho em nós de um
mar profundo.
Naufragamos sem praia; e na solidão dos botos
afundamos.
É tentação a vertigem; e também a pirueta dos ébrios.
Eternos! Eternos, miseravelmente.
O relógio no pulso é nosso confidente.
Mas eu não quero ser senão eterno.
Que os séculos apodreçam e não reste mais do que uma
essência ou nem isso.
E que eu desapareça mas fique este chão varrido onde
pousou uma sombra
e que não fique o chão nem fique a sombra
mas que a precisão urgente de ser eterno bóie como uma
esponja no caos
e entre oceanos de nada
gere um ritmo.
Carlos Drummond de Andrade